quinta-feira, 26 de junho de 2008

E daí?




Não é todo dia que se ouve algo deste nível...

(Milton Nascimento e Ruy Guerra)

Tenho nos olhos quimeras
Com brilho de trinta velas
Do sexo pulam sementes
Explodindo locomotivas
Tenho os intestinos roucos
Num rosário de lombrigas
Os meus músculos são poucos
Pra essa rede de intrigas
Meus gritos afro-latinos
Implodem, rasgam, esganam
E nos meus dedos dormidos
A lua das unhas ganem
E daí?

Meu sangue de mangue sujo
Sobe a custo, a contragosto
E tudo aquilo que fujo
Tirou prêmio, aval e posto
Entre hinos e chicanas
Entre dentes, entre dedos
No meio destas bananas
Os meus ódios e os meus medos
E daí?

Iguarias na baixela
Vinhos finos nesse odre
E nessa dor que me pela
Só meu ódio não é podre
Tenho séculos de espera
Nas contas da minha costela
Tenho nos olhos quimeras
Com brilho de trinta velas
E daí?

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Altruísmo ou Egoísmo???

Algumas semanas atrás em uma festa, eu estava conversando com alguns amigos quando mais uma vez veio o assunto Isabella Nardoni, de fato não é um assunto muito legal para ser falar em uma festa, tentei mudar o rumo da prosa mas a pessoa insistiu em continuar falando mesmo quando não estava agradando, algumas pessoas se afastaram, mas eu não

Pessoa – Nossa que coisa horrível fizeram com aquela menina Isabella, né? Onde é que este mundo vai parar...estou extremamente abalada, tenho chorado quase todos os dias.

Pela inconveniência da pessoa, não resisti e deixei falar por uns 20 min sobre o caso, ela sabia o nome dos advogados, quantas páginas já tinha o processo, quais eram as possibilidades de condenação e todas possíveis penas que teriam que cumprir o tal casal assassino. Ah...importante dizer que a pessoa não era advogada, mas estava com o código penal na ponta da língua, afinal a Globo praticamente deu um “Telecurso 2000” de Direito Criminal.

Eis que abri minha boca grande, já que não sou o fã nº 1 da pessoa e estava um pouco alcoolizado, achei pertinente levantar algumas coisas, no princípio foi por um pouco de provocação, mas depois o assunto ficou mais sério.

Eu – Você ficou sabendo, do menino que morreu de fome no nordeste esta semana???

Ela – Não...- com uma cara de não muitos amigos por ser interrompida enquanto demonstrava seu “sofrer” – não estou sabendo não, mas o que isto tem a ver com esta nossa conversa?

Eu – Tudo...

Ela – Como assim tudo, a menina foi assassinada, foi um crime que abalou todo mundo, você não se sentiu abalado?

Eu – De verdade não, não foi uma pessoa próxima, não foi em minha família. Achei uma coisa horrível realmente, ela não merecia, mas não posso ser hipócrita em afirmar que me abalei porque não estaria sendo verdadeiro, nem comigo e nem com as pessoas a minha volta. Veja do seguinte ponto...não é estranho você se abalar com a morte de uma criança brutalmente assassinada que a mídia resolveu explorar o caso e não se abalar com a morte de outra criança brutalmente assassinada?

Ela – Mas uma morreu assassinada e a outra morreu de fome.

Eu – E ser vítima da fome não é a mesma coisa que ser assassinada em um país considerado o segundo maior produtor de grãos do mundo, primeiro em exportação de carne...se isto não é assassinato, não sei o que é então.

Silêncio...

Quero deixar claro aqui que não estou diminuindo a morte de nenhuma das duas crianças e nem dizendo que as dores geradas às mães de ambas são diferentes, mas estranho quando passamos a achar importante só aquilo que nos é jogado na cara, ou seja, o que a Globo resolve colocar no ar.

Antes de ser criticado pelo que falei, quero dizer que não fiquei feliz pelo caso trágico que acompanhamos, mas fiquei assustado ao observar como as coisas passam pelos seres humanos, temos a estranha ou fantástica capacidade de relevar os fatos e prestar atenção apenas naquilo que nos interessa e me assusto ainda mais quando vejo pessoas interessadas na questão somente porque a mídia mostrou.

Não estou dizendo que sou uma pessoa exemplar e assumo que faço muito menos do que eu poderia pelas pessoas, assumo também que minhas preocupações estão muito mais ligadas ao que me interessa, sendo família, trabalho, amigos e eu mesmo.

Egoísta talvez, mas quem não é? Sei que tenho bondade em meu coração, compartilho da forma que posso ou quero, já me disseram que sou uma pessoa altruísta, é bem possível que sim, mas só se for no conceito budista.

No budismo, o altruísmo é considerado o caminho que nos leva à iluminação. Uma atitude altruísta pode ser interpretada como caridade se bem relacionada com os interesses do próximo. Agir de forma altruísta, é dar-se ou beneficiar alguém em troca dos mesmos prazeres. Por ser uma atitude de divisão, não se trata de um pensamento egoísta, no entanto, uma atitude altruísta pode ser confundida com egoísmo, quando misturamos nossos prazeres pessoais com a insatisfação de quem os recebe. No budismo, ser altruísta em geral é muito positivo, além do grande prazer em dedicar-se ao outro, cria laços de confraternização, o que nos faz crescer interna e externamente. Quando reconhecemos as necessidades alheias, sentimos nossa percepção do mundo ampliar. A vida tem significados maiores quando somos úteis e nos sentimos mais ativos socialmente.